30 abril 2007

duas tentativas


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Nous sommes tous des gendarmes français



A D. Quixote traduziu e o Ipsilão deste fim-de-semana entrevistou a autora, Tatiana de Rosnay. O livro relata um episódio triste da ocupação nazi da França. Em 16 e 17 de Julho de 1942 a polícia francesa prendeu milhares de judeus que levou para um pavilhão desportivo, o Velodrome d'Hiver. Aí começou uma tortura que acabaria em morte nos campos de Drancy e Auschwitz. A rusga da noite de 16 de Julho ficou conhecida pela Raffle du Vel d'Hiv, mas só há pouco tempo é do domínio público. Já o Rui Bebiano escreveu sobre isto, a propósito de um livro de história contemporânea. O que hoje sabemos sobre o Holocausto, sobre o colaboracionismo francês, sobre o comportamento do Exército Vermelho na marcha para Berlim e nos combates que levaram à queda e rendição do III Reich, é matéria de divulgação recente. A história do gulag estalinista, obras como Volcano and Miracle de Gustaw Herling (Penguin Books, 1996) ou A World Apart, Arbour House, 1951 (citadas por John Gray em Sobre Humanos e Outros Animais) nunca foram divulgadas entre nós. É neste terreno de ignorância que cresce gente como a Rita da Covilhã ou, em outro registo, os rapazes da JCP que, ao que dizem, apuparam Edmundo Pedro no 25 de Abril.
Na Kolyma soviética o preso Chalamov escrevia: "Há circunstâncias em que um homem tem de se apressar a morrer se não quiser perder a vontade de morrer." E John Gray, no livro já citado acrescenta: "Nos seus piores extremos, a vida humana não é trágica, mas sem sentido." Os polícias que levaram para o hipódromo famílias inteiras, os vizinhos que calaram, os que os enviaram para Drancy, onde Max Jacob morreu de inanição, os que conduziram os comboios, os guardas dos campos de extermínio, eram gente como nós. Gente como nós em situações excepcionais. É preciso perceber como se geram as circunstâncias excepcionais, como cresce a bestialidade, como se cria o clima que torna possível que o gendarme francês se transforme em verdugo. Há dias em que pensamos que somos todos judeus alemães, que somos todos berlinenses e nos orgulhamos do que somos. Mas somos todos polícias franceses. Quando reina o medo e a insegurança, quando há pouca comida, quando ressoa o silêncio nos jornais, quando aos mais fracos não é reconhecida toda a humanidade, nesses dias podemos ser todos polícias franceses, cumprindo exemplarmente as ordens do ocupante.

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A rapariga do trapézio desconfia da rede.

Escreve pouco. Mas quem como ele é capaz destes sainetes poéticos?



A rapariga do trapézio desconfia da rede. Foge para a frente. No dia em que acreditar na rede os pés podem-lhe perder o respeito. O arame, o arame. Só o arame.

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29 abril 2007

O Ipsilao. En français, L'Ipsilon



Exmo. Senhor Director

O suplemento Ípsilon de 27 de Abril contém uma longa entrevista a Jean d'Ormesson, na qual quer o entrevistador quer o escritor se mostram preocupados com o declínio da língua francesa. Et pour cause... nem de propósito, os atropelos linguísticos sucedem-se neste suplemento com um ritmo estonteante.
Nas pp. 4 a 9, depara o leitor com um artigo dedicado ao cantor Camané. Aí, para além de o nome da famosa canção de Jacques Brel, "Ne me quitte pas", surgir sistematicamente com uma grafia incorrecta (é "quitte", e não "quites"), o cantor Camané e o jornalista João Bonifácio são unânimes no elogio a esta "bandeira do Brell"; só é pena que nem um nem outro pareçam ter percebido que "l'ombre de ton chien" é "a sombra do teu cão" e não "o ombro do teu cão". Os resultados desta tão bizarra tradução estão à vista do leitor na p. 6, e constituem um diálogo verdadeiramente hilariante.
Mais à frente, na entrevista a Jean d'Ormesson (p. 36), Adelino Gomes presta um mau serviço à língua e à história do país de origem do escritor, que se refere a Talleyrand. Ora o nome do famoso homem de estado francês surge com a grafia "Talleron". Já agora, na expressão "avant la lettre" (p. 36), "lettre" não tem acento circunflexo, e em "c'est comme ça" (p. 37), "ça" não tem qualquer acento grave.
Algumas páginas a seguir, é a vez de a jornalista Helena Vasconcelos se referir à violoncelista Jacqueline du Pré como "Jacqueline Du Prés".
Fico-me por aqui. Creio que este número do Ípsilon constitui uma prova evidente da incultura e do desleixo reinantes. Hélas...razão têm os academistas franceses em verter lágrimas amargas.

Maria José Goulão


Exmo Senhor Director

O que é o ombro de um cão? Estará o poeta camané a pensar que descobriu a origem da metáfora? andará ele a tresler o herberto helder enquanto semi-cerra os olhos para fadunchar? Poupem-nos entrevistadores e entrevistados que não sabem usar um dicionário! O ombro de um cão virá dos confins dos anos 80 em que a todo o ser vivo era prescrito o uso compulsivo de chumaços?! EXIGIMOS SABER ONDE DIABO HÁ CÃES COM OMBROS! De certeza que não era no poema do Brel...

Ó camané: sinceramente, não me quilhes, pá!...



Rosa Oliveira


(Das Cartas ao Director do Jornal Público)

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28 abril 2007

O gabinete de Sócrates

Eu leio isto assim: O gabinete de Sócrates tem 148 pessoas. Mas de novo, quer dizer, de novo, de novo, ele só nomeou 53. As outras eram do Santana Lopes. Pagas por ele, mas do Santana Lopes.
Será que eu li bem? A notícia só é confusa para mim? Estou de má fé? A Abbondanza é assessora ou colaboradora eventual?

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Acertar o período


AES+F



Quando viveu com as mulheres viu como elas acertavam entre si as crises de asma, as euforias, o período, as compras e as lágrimas. Ele não podia contribuir senão com prosaicas dores de barriga e melancolia. Faltou-lhe sempre o sangue, o sangue.

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27 abril 2007

May Day



A primeira parada MayDay de Lisboa é uma festa rebelde que junta operador@s de call center, imigrantes, bolseir@s, intermitentes do espectáculo e do audiovisual, estagiári@s, desempregad@s e contratad@s a prazo, estudantes-(já/ainda/quase)-trabalhador@s, etc…


No MayDay, desfilaremos contra a exploração, contra o emagrecimento dos apoios sociais e à habitação, pelo direito a trabalhar sem chantagem e a um mínimo de independência e conforto. Ninguém quer passar o resto da vida a pensar como pagar a próxima conta e a fazer malabarismos com três trabalhos precários.

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A glória fácil


Maggie Taylor


Um dos acontecimentos mais interessantes da blogosfera que leio é a degenerescência do Glória Fácil e a sua passagem a blog situacionista. A glória não foi fácil, demorou. Quando chegou deu aquele contentamento. Preferia não ter assistido, mas assisti. Preferia não ter escrito isto, mas já escrevi.

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O 25 de Abril pela gente da Abbondanza



As comemorações do 25 de Abril mostram o país que somos e onde chegámos.
Felizmente que há gente como Isabel Coutinho (Público) para descrever a "pompa e circunstância" do protocolo que acentua "o deprimente retrato geral". Ou como Constança Cunha Sá que num comentário sobre a presidência ornamental de Cavaco escreve : "O prof Cavaco pode estar genuinamente preocupado com a transformação de uma data libertadora num ritual vazio que se esgota num pequeno conjunto de participantes. Mas devia preocupar-se muito mais no dia em que o 25 de Abril se transformasse, de novo, numa data viva, que galvanizasse a população em geral, incluindo os jovens que ele tanto aprecia: porque nesse dia, sim, algo de essencial poderia estar em perigo."
O sinal mais claro da degenerescência do regime é a reacção dos plutarcas ao discurso de Paulo Rangel. Da direcção de Sócrates a Júdice e a Pinto Ribeiro todos consideraram o discurso "deslocado". Deslocado! Eu acho (como escreveu Francisco Teixeira da Mota) que o discurso de Paulo Rangel, sobre o perigo das liberdades, é um discurso esquizofrénico, porque se dirige para as bancadas do partido do governo e do seu próprio partido. Mas é uma intervenção que honra o 25 de Abril. É ao ler a homilia de Maria de Belém que percebemos o tom que o estabelecimento considera apropriado à comemoração: "Era primavera cheirava a madrugada e havia música no ar ponto de exclamação E flores vírgula muitas flores vermelhas que passaram a chamar-se liberdade ponto final" A jornalista Isabel Coutinho ficou arrepiada. Houve outros jornalistas que se preocuparam mais com os aspectos fashionable da Assembleia, embora neste campo os laçarotes de Maria de Belém estivessem de acordo com a lenga-lenga progressista e a modista merecesse uma referência.
À tarde, um pequeno "grupo de anarco-libertários" manifestou-se junto à ex sede da ex PIDE. A polícia, calcule-se, "reconheceu-lhes os símbolos" e encheu-os de porrada democrática. Uma questão genética e cultural. A polícia do estabelecimento democrático reage assim aos símbolos anarco-libertários. Pasolini dizia à bandeira vermelha para voltar a ser farrapo e que os mais pobres a levantassem. No 25 de Abril de 2007 ninguém levantou o farrapo. Se alguém o fez vai ser entregue à justiça sumaríssima.

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26 abril 2007

Paulo Rangel reeducado

Paulo Rangel, segundo o jornal Público, proferiu ontem, na Assembleia da República, o seguinte discurso:


Contra a "letargia cívica e anestesia cidadã", o PSD fez ontem das comemorações oficiais do 25 de Abril, no Parlamento, um exercício de democracia: "Denunciar, sem medos, com serenidade e exigência, os novos perigos e ameaças para a liberdade dos cidadãos". Paulo Rangel fê-lo num registo raro à direita, ao criticar aquilo que considera ser um "ambiente de condicionamento da liberdade" de opinião e de expressão, por um lado, e o modelo "concentracionário" em elaboração em matéria de informações e forças de segurança, por outro.
"Não podemos alhear-nos das ameaças e nebulosas que espreitam e envolvem" a democracia, começou por avisar. Para logo questionar: "Como garantir e realizar essa democracia de valores, essa república da tolerância e do pluralismo, se nunca como hoje se sentiu uma tão grande apetência do poder executivo para conhecer, seduzir e influenciar a agenda mediática?" Aquilo a que chama "impulso de sedução e domínio" não se limita ao "alinhamento e à agenda" da comunicação social, mas chega ao "controlo mais directo ou indirecto de órgãos de comunicação ou das suas estruturas de gestão", considerou.
"E não falamos apenas da política de comunicação", frisou, embora ainda acrescente as "soluções legislativas que avaliam e adjectivam a qualidade do jornalismo". Foi mais longe: "Falamos da liberdade de expressão individual" do cidadão comum, "trabalhador ou empresário, desempregado ou quadro médio, estudante ou funcionário público". Não, não são só os media. "É também a sociedade portuguesa que está condicionada". "Nunca como hoje, em décadas de democracia, se sentiu este ambiente de condicionamento da liberdade", considerou. "Do ponto de vista dos valores processuais da liberdade de opinião e da liberdade de expressão, vivemos aqui e agora - ai de nós! - num tempo de verdadeira "claustrofobia democrática"", acrescentou. Ouvem-se protestos da bancada socialista.
Mas as críticas não estavam terminadas e Rangel lança a segunda farpa, sobre a reorganização da segurança interna. "O executivo prepara-se para legitimar, com a chancela da lei, a total concentração do poder de mando civil, o poder policial", dispara. Com uma agravante, afirma: "Cria-se, sob a alçada do chefe do executivo, um secretário-geral que tanto coordena como ordena e que passará a tutelar todos os corpos policiais, aí incluída a Polícia Judiciária". Tudo isto a par de um Conselho Superior da Investigação Criminal, "presidido também pelo chefe do executivo, em que tem assento o procurador-geral da República, em posição estatutária de alto funcionário, subordinada e nunca antes assumida".
No fim, sobravam-lhe interrogações como esta: "Como aperfeiçoar um sistema democrático, se ao fim de 30 anos de experiência e maturação, esse sistema declina, desliza e derrapa para um modelo simplista e "concentracionário" do "Grande Intendente" que tudo supervisiona, tudo tutela, tudo vigia?"



f., comentou assim no seu blog:


o deputado paulo rangel subiu à tribuna do 25 de abril para decretar o fim da liberdade e o terrível advento da opressão. o país ficou decerto transido. eu, por exemplo, nem queria acreditar na cor do casaco do parlamentar e no bem que ficava com a gravata. se o deixaram aparecer assim, nem tudo está perdido. fosse eu a mandar e a fashion police tinha-o internado de imediato para reeducação demorada, a cargo da eduarda abbondanza e da isabel branco. a não ser, claro, que se trate de um problema constitucional, do género oftalmológico.

Na fotografia da AR pode-se ver Paulo Rangel. E em primeiro plano,como seria Rangel após a conveniente reeducação.

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25 abril 2007

Este foi o dia


Chagall

Acordaste-me, cedinho, para a notícia. Ainda ouço a chave na porta, a tua voz. Ainda vejo o teu casaco azul. Saímos para a rua. O dia estava parado. À espera. Na faculdade, aproveitámos para suspender as aulas. Fomos para a Praça, à procura de notícias. A rádio passava música sinfónica. Qualquer pessoa com mais de dezoito anos percebia que era música fascista. E que os fascistas estavam aflitos. Só mais tarde soubemos que o Emissor Regional cumpria ordens de um governador civil fiel ao governo. A meio da manhã o meu pai telefonou, garantindo que em Lisboa as ruas estavam cheias de gente vitoriando os militares que derrubavam o regime. O meu pai esperara tanto por esse dia que pensámos que ele exagerava, como era costume. Depois não me lembro de mais nada. Achei sempre que havia gente de mais nas ruas. Alegria em excesso. Uma esperança impossível de realizar.

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24 abril 2007

Fim-de-regime


Maggie Taylor

O presidente do Conselho de Administração dos HUC demitiu-se. O presidente da Administração Regional de Saúde, um aparatchik de nome Regateiro, foi substituí-lo. Um sinal de fim-de-regime. A lógica sacrificial do aparelho em tempos difíceis. Espera-se agora que Campos ocupe o lugar de Regateiro.

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Os dias do fim, #2

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Uma Vassoura Azul



A minha filha chama-lhe Náufrago, ao homem na foto (penso que pela barba muito longa, que entretanto cortou). Dorme nessa mesma traseira, rodeado da própria merda, de panos imundos, de restos de alimentos e outra panóplia indecifrável. Junto aos caixotes do lixo, vão os funcionários do supermercado despejar alimentos fora de prazo, que recusam dar a quem os pede. Já os vi atirar carne e fruta para dentro dos contentores, que é seguidamente retirada com enorme esforço por quem a tinha antes pedido.

O Náufrago tem uma vassoura. Azul. A realidade é poética quando se ri da Razão.

(foto de CJ; comentários de Maria em pescada nº5)

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23 abril 2007

Distopia

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Parem com a vergonha do Darfur


Sete dias para pôr fim à matança. Para quebrar a indiferença. Para que a nossa época não continue a ser a época dos genocídios debaixo da indiferença.

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22 abril 2007

A vida boa, a vida


Blue


Está um dia radioso no carso e nas charnecas. Vencer Loureiro, Moura e os que os aconselham, é seguir o preceito do livro de Chuang-Tzu: "A vida boa não tem propósito. É como nadar num rio, respondendo ao vaivém das correntes.
"Entro com o influxo e saio com o refluxo; sigo o caminho da água e não lhe imponho o meu egoísmo. É por isso que me mantenho à tona."

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As eleiçoes francesas

Eu não voto, nas eleições francesas.

Entre Moura e Loureiro

Dias Loureiro, cardeal de Cavaco, apresentou-se como candidato à representação do circulo de Coimbra numas eleições para a Assembleia da República. Os eleitores confiaram nele. No dia seguinte ocupou cargos no BPN.
Pina Moura, cardeal de Guterres, apresentou-se como candidato à representação do círculo do Porto numas eleições para a Assembleia da República. Os eleitores confiaram nele. No dia seguinte ocupou cargos na Iberdrola.
Dias Loureiro é uma pessoa competente. Pina Moura é uma pessoa competente. As competencias de Moura e Loureiro consistem em conhecer o Estado do ponto de vista dos investidores privados.
A democracia portuguesa está cheia de Mouras e de Loureiros.
E cheia de gente que deve favores a Moura e a Loureiro.
Ou que sabe que um dia pode precisar de Moura e de Loureiro.
Ou que tem medo de Moura e de Loureiro.
Ou que tem medo.

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21 abril 2007

VPV

A crónica de hoje de VPV no Público é arrasadora. Um "filho da guerra fria" e "da democracia falhada", naufragando e sentindo que um mundo soçobra com ele. Um estilo final. Os rapazes e raparigas do país orgulhoso podem agitar os farrapos e contrariar esta visão pessimista. Ninguém os distinguirá dos figurantes de um anúncio de banco ou de cerveja.

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Os limites do pluralismo na 2

Na rtp2 José Pedro Aguiar Branco debate com José Miguel Júdice. A moderação é assegurada por um competente jornalista em transito para uma assessoria ministerial. A argumentação de Aguiar Branco ganhou alguma clarividência relativamente às prestações de Fevereiro. Júdice está bem como quase sempre. Há algum tempo que José Miguel Júdice descolou dos terrenos da política partidária com agenda. Neste debate sobre as reformas da justiça Júdice emite opiniões que fazem sorrir pudicamente Aguiar Branco. Podemos considerar que no pluralismo que este programa da 2 permite, Júdice assegura a representação de sectores que se não revêm no advogado do Porto.

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Bom dia, Rosa

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Monologo de Alice

Gosto de ti, Candida. Albicans.

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Nunca mais no limbo

Boas notícias. Acabou o estágio. Os inocentes vão directamente para o paraíso.
(Ver Rui Bebiano,aqui)

Sabado


Maggie Taylor


Filipe Moura sobre o massacre americano

Filipe Nunes Vicente pensando em Virgínia, Bagdad, Darfur. O multiculturalismo é um monóculo vesgo

O voto francês de Rui Curado da Silva

Até tu Soares, do Masson

Henrique Mota A saúde não tem preço mas pagamos.

Eduardo Pitta: Je, and maybe others

Livio Librescu evocado por Lutz

João, sobre a admiradora que Hitler tem na Covilhã

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20 abril 2007

Não देवे सबेर, não देवे ver


Varlam Chalamov


John Gray, cujo livro Straw Dogs abri numa viagem de avião, em casa à noite, e em outras pausas do trabalho, ensinou-me, em todos os instantes em que o li, coisas terríveis.
Não digo verdades terríveis porque não sei o que sejam verdades, nem é a busca da verdade o que me faz viver. Ângulos diferentes de observação, um outro pensamento, uma reflexão menos habitual. Gosto de cada página do livro, cada página me dá a exaltação e a gravitas da partilha de qualquer coisa assombrosa, que não é o conhecimento mas é uma aproximação ao conhecimento.
Não vou falar da tese principal do livro, a de que o humanismo é o sucessor laico do cristianismo, um reduto do antropocentrismo. Os meus amigos não entendem, julgam que estou a fazer a propaganda do Encoberto, de Israel, do Irracional. Nem eu tenho saúde para isto, nem os tempos correm a favor. Vou só falar de temas laterais.
Com John Gray conheci o escritor Goronwy Rees, que não encontrava em si qualquer processo unificador a que se pudesse com rigor chamar um “Eu”. E Varlam Chalamov, um autor do gulag, que passou 17 anos numa ilha de morte chamada Kolima, “um campo árctico onde morria por ano um terço dos prisioneiros”, e que escreveu:
“Há muitas coisas que um homem não deve saber, não deve ver e, se as chegar a ver, melhor será que morra.”


John Gray, Sobre Humanos e Outros Animais, Lua de Papel, 2007
Varlam Chalamov, autor de Histórias de Kolima, sobre o Gulag soviético
Goronwy Rees, escritor irlandês a quem a filha chamou o senhor Ninguém, espião russo.

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until / Great Birnam wood to high Dunsinane hill / Shall come

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19 abril 2007

दे एस्कुएर्दा ए पोर Israel

O jornal Público distribuiu gratuitamente, nesta terça-feira, um pequeno livro de Amos Oz que reúne três conferências de 2002.
Contra o fanatismo é uma reflexão bem-humorada sobre os mecanismos que conduzem à postura fanática.

Digo que a semente do fanatismo cresce quando se adopta uma postura de superioridade moral que impede a obtenção de consensos- escreve Amos.
A essência do fanatismo reside no desejo de obrigar os outros a mudar- escreveu Amos.

Os conselhos de Amos Oz são simples: ter humor, imaginar o outro- ouvir o choro do bebé que sobreviveu à matança, ser uma península.

Nos textos seguintes, Amos Oz discute as condições para a paz. E lembra um facto fundamental que a esquerda europeia subestima ou ignora: os israelitas são um povo de refugiados, “um punhado de refugiados e sobreviventes meio histéricos”. Refugiados dos países árabes e islâmicos, refugiados da Europa, refugiados da África. A propósito conta que o seu pai saiu da Europa nos grandes progroms que anunciaram o Holocausto. Nessa altura, diz, as paredes da Europa tinham inscrições que diziam: Judeus, vão para a Palestina. Cinquenta anos depois o velho pai de Amos, sobrevivente, voltou às mesmas ruas, nas mesmas cidade, para ler, nas paredes, as inscrições da esquerda militante: Judeus, fora da Palestina!
Pode não ser assim. O Tiago e o Rui Bebiano deram espaço à declaração de Espanha, onde se defende uma outra política face a Israel.
Subscrevo.

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Lorca

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Post retirado

às 8:15h inseri aqui um post que agora retirei.

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18 abril 2007

O motim



Eu vi esta cidade arder duas vezes
durante a minha vida
mas a coisa mais extraordinária
foi a chegada dos
políticos depois das
consequências
proclamando os erros
do sistema
e exigindo novas
políticas para e a favor dos
pobres.

nada foi alterado da última
vez.
nada irá ser alterado desta
vez.

os pobres irão continuar pobres.
os desempregados assim
irão permanecer.
os sem abrigo irão continuar
sem abrigo

e os políticos,
que vivem bem, irão viver
muito bem.

Charles Bukowski

versão de manuel a. domingos
(copiado
daqui)

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17 abril 2007

Window vista num monitor CRT 17"

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Amos Oz hoje com o Publico



Hoje levem para casa o Israelita que fala de paz. Não custa nada.

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Pros e Cons


Vi sem som. É a maneira primária de perceber. Prescinde-se da retórica, sempre a mesma. Das palmas dos estudantes, a tropa de choque. Se fosse hoje, escolhia uma Universidade em que o Reitor me oferecesse confiança.

16 abril 2007

“À última hora mandou-lhe um cartão: «Venha.»”




Amanhã, terça-feira (17.04), entre as 12:00 e as 15:00, na Sala de Reuniões do
Pavilhão Sul (FBAUP).


Ainda,

Fátima Silva.

Laura, meu amor


Sam the Kid, himself

No sábado passado teve lugar em Coimbra o maior evento de hip-hop da zona
centro - o FlowFest. Contou com a presença de Sam the Kid como cabeça de
cartaz, para além de muitos outros, alguns conhecidos, outros a darem os
primeiros passos. A imprensa não esteve particularmente activa. A organização
esteve a cargo de João Francisco (17 anos), Laura (16 anos), Dino (16 anos) e
Guilherme (17 anos). Na audiência estiveram 1100, quase todos jovens como
eles.
Se isto não mereceu a atenção da Natureza do Mal para que serve afinal a Natureza do Mal?

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Mudança

Pedro Mexia agora no ipsilão. José Mário Silva lê-se noMorel. O canil há-de encontrar o seu tempo. Digam-me onde encontrar o João Lopes e ainda me vou rir da maldição do Rui Bebiano

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Os dias do fim

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15 abril 2007

Os dias do fim


Praça dos Grilos, Porto. De Blue, em Blue


Definitivamente: é absolutamente irrelevante a questão das qualificações de José Sócrates. Não sei qual a formação ideal para um chefe de governo, em 2007. São secundárias as motivações do sôr zé manel furnandes ou do expresso. A questão já foi explicada algures e foi mais ou menos assim que o meu mestre ma resumiu: com Sócrates as jotas chegaram ao poder. Os jotas, rapazinhos que hesitaram em inscrever-se na jsd ou na js, estiveram um ano à frente de uma associação de estudantes e no ano seguinte, deixando os estudos para trás, apareceram como assessores do ministro, nº 26 das listas partidárias, qualquer coisa nas águas municipais ou na comissão de coordenação. Aprenderam o que interessa: quem é quem e como se concorre às verbas européias, se criam e desfazem empresas. Agora saltam do tecido empresarial para a política pura. São amigos dos jornalistas que contam. Dão umas dicas, em off. Vestem o avental que estiver a dar. Se perderem estas eleições saberão acatar os desígnios populares. Farão a passagem pelo deserto de uma empresa, ou de um banco, onde a verdadeira paridade é respeitada. A que assegura que um ex jota do psd, ou equiparado, terá sempre ao lado um jota do ps ou equiparado. O que conta, nas equivalências, é esta origem, esta fidelidade primordial.
É por isso com amargura que leio as boas almas ingénuas, verdadeiramente boas e ingénuas- não ironizo nem este sarcasmo me alivia. Continuam a escrever sobre a discriminação relativamente aos licenciados, sobre os maus, os da oposição ou os das opas derrotadas, que estão por detrás de tudo. Negamos a realidade se ela não se conforma com as nossas mais fundas ilusões, assim explica John Gray o olhar benigno com que os intelectuais bem pensantes contemporizaram com as grandes matanças do século XX. Não estamos preparados para um mundo assim. Precisamos de Salazar e de Cunhal, dois príncipes sem mancha. Era bom que Sócrates fosse sei-lá-o-quê, mas seguramente qualquer coisa diferente do amigo de Vara, o aluno do professor das quatro cadeiras que também era consultor da HLC, a empresa da Covilhã que prosperou nos idos do Ambiente. Não acreditamos que este seja o tempo do triunfo dos jotas. Que os dias do triunfo dos jotas sejam os dias do fim.

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14 abril 2007

Esse "algo" inexistente que governa as nossas vidas



cj e pescada nº5

(...) É esse o nosso sonho primordial, que faz com que vivamos as nossas vidas como se de sonhos se tratasse.

e John Gray em Straw Dogs, Sobre Humanos e Outros Animais

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13 abril 2007

Não é nada comigo

Com o despedimento de Vítor Dias pelo director do Público e de Ruben de Carvalho pelo Marcelino o Partido Comunista ficou sem nenhum colunista nos dois tablóides de referência. Não acho bem, fico preocupado, lembro-me sempre do poema do Brecht.

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Quiz2


Josef Koudelka, s.t. (Espanha), 1971

Qual a última glória a que o usufrutuário de uma casa de banho minúscula acede?

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12 abril 2007

Quiz


Quem faz o quê na sombra deste olhar?

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A linda Susana

Escreve sobre a pirosidade.
(com Yue Minjun)

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11 abril 2007

Mais Socrates

Também é estranho que se tenham encerrado serviços de Urgência antes de abrir as unidades que se anunciam," bem apetrechadas em equipamentos e recursos humanos". Não seria normal e mais saudável que se tivesse seguido exactamente o procedimento inverso?

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Ainda Socrates

Alguém anda a aconselhar mal Sócrates. A mortalidade neonatal não melhorou por Leonor Beleza ter encerrado maternidades. Melhorou porque, nessa altura, foram levadas a cabo alterações sem par na política de saúde: apetrechamento das maternidades centrais e distritais com equipamento adequado, criação de lugares de neonatologistas no quadro de pediatria dos hospitais, redimensionamento dos quadros de obstetrícia, anestesiologia e enfermagem, formação de pessoal especializado, criação de um sistema eficaz de transporte neonatal, fomento de uma rede ligando os cuidados primários de saúde na gravidez e na infância aos cuidados diferenciados hospitalares.

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A resposta de Socrates


Sócrates respondeu à pergunta que lhe tinha feito ( e que os entrevistadores repetiram cinco vezes): escolheu a UnI porque era perto do Isel e tinha horário pós laboral.
Sócrates respondeu aliás a todas as questões. Lembrava-se do nome dos professores (deve ter sido horrível ter tido António José Morais como professor a quatro cadeiras e é significativo que, apesar de ser da mesma região, ter coincidido com os negócios da HLC, ter sido nomeado para um alto cargo da administração socialista, ele não ter com ele nenhuma relação especial de proximidade) e de muitos acontecimentos relacionados com o seu curriculo escolar. Esteve calmo e convincente face a dois jornalistas que não estavam ali para fazer o frete. Mostrou que gostava daquilo. Não haveria provavelmente ninguém que tivesse aguentado o desgaste pessoal de vinte dias de expectativa e suspeição (que ele alimentou) e depois aparecesse com tanta frescura e vontade de poder. Merece ser o primeiro ministro dos portugueses. Aliás, para dizer exactamente o que penso, Sócrates é mais do que merecemos.

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Um ratinho


Damien Hirst, A thousand years

Ontem à noite passava por um beco junto à ruina de um mosteiro. A ruína é envolvida agora por uma cerca da construtora cujo nome não escreverei, que este blog não é da construção civil. A luz é crua à hora em que passo. Não há ninguém. Atrás da cerca empilham-se seringas, garrafas e outro lixo vulgar. No chão, de pedras antigas, estava um ratinho morto. Quase não daria conta dele de tal modo se funde contra o calcário que é da cor parda do seu pelo liso. Mas foi pisado e as vísceras sobressaem, rosadas. Iguais às minhas, ainda cobertas. Não sou mais do que o ratinho morto, ali onde o Ippar ou o seu sucedâneo neo liberal, conservou uma parede espectral. Não sou mais, vivo, que o ratinho morto. Não tenho mais valor que o ratinho. Nem percebo em que escala se medem estas coisas de que só falo por ter visto, no domingo à noite o José Manuel Pureza, um crente e um humanista, a falar, com a voz profunda com que é suposto um crente e um humanista falarem, do sentido último das coisas, como se Caeiro ou Dawkins não tivessem existido. Mesmo isto que escrevo não tem obviamente qualquer valor, nem eu destruiria as crenças benignas de alguém, sobretudo de Carlos Fiolhais, que leu John Gray numa viagem de avião, suponho que de curta duração.

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O nome dos professores


Jeff Walls, never happened


No secundário o meu professor de Matemática chamava-se Silveirinha. Vimo-nos até não haver mais muletas que lhe permitissem a ambulação, nem passeios transitáveis onde ele coubesse. A minha professora de português deu-me um livro do poeta Sebastião da Gama, na altura dos pentelhos e da mudança de voz. Chama-se Beatriz Paula e posso repetir-lhe hoje os versos que lemos juntos, nas cadeiras do liceu D.João III. O meu professor de Fisiologia foi um médico, Gouveia Monteiro. Numa aula que tinha por fundo as badaladas da Sé Nova aprendi para toda a vida a sequência da defecação, essa coisa baixa. Isto de que falo não é um problema da dra. Maria de Lurdes Rodrigues, nem do prof. Mariano Gago, muito menos do director da PJ, cujo nome de facto não recordo.

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Estamos esclarecidos



Não sou nenhum menino de coro

( J.Marcelino, director do DN, na SIC notícias, esta noite)

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10 abril 2007

A pergunta a que eu gostaria que Socrates respondesse


Porque escolheu a Universidade Independente (UnI) para obter a licenciatura?

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Um pequeno problema


Faltam verdadeiras testemunhas da ressurreição.

(José Policarpo, responsável nacional da ICAR, no discurso de domingo)

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09 abril 2007

A tia gena foi embora e não volta



Tenho no corredor, perto do meu quarto, uma foto do final da segunda guerra mundial, que aparentemente nos passou ao lado, uma foto de estúdio tirada numa pequena vila do coração do país. Foi tirada num momento de perfeição e ficou suspensa no tempo. São três irmãs de ombros sobrepostos como um leque de cartas. Olham para a câmara e não parecem excessivamente felizes mas também não desconfiam que o mundo lhes possa ser adverso. Nos sorrisos diferentes e comedidos parecem ser o que são: filhas do salazarismo, de tempos obscuros, cheios de necessidades imediatas impossíveis de satisfazer, sem os horizontes vastos e promissores que são devidos à idade que têm. De olhares diferentes cada uma delas, a do meio mais confiante porque sabe que terá à sua frente uma profissão dura mas com destino traçado, a da esquerda com olhar meigo levemente assustado, perfeita no rosto equilibrado mas ainda assim apreensiva porque desconfia que não será feliz, tem sobrancelhas clássicas e nunca deixará a doçura que já lhe trespassa o rosto como uma auréola eterna, a da direita encolhe-se, sentindo-se apoucada ao lado das irmãs que julga serem mais bonitas. É a única que não usa colar de pérolas de imitação e não cuidou como as outras do penteado, disfarçando um certo desleixo caseiro com uma fita um pouco infantil no cabelo menos ostensivo e saudável do que o das irmãs. Esta última é a mais velha e, como todas as irmãs mais velhas, mais exposta à inexperiência dos pais. Sempre se quiseram umas às outras, sempre esperaram, mais cedo ou mais tarde, vir a viver perto umas das outras, mas a vida obrigou-as a passarem longos tempos afastadas e preocupadas com o que estaria a acontecer às demais. A da direita é a tia gena e acabou de morrer. Morreu com ela uma parte de nós que ficámos a contemplar de longe a sua lenta decadência. Ninguém a pode fazer voltar, ninguém pode repor a confiança que já na altura não tinha. Algum tempo antes desta foto, tinham recebido em casa duas judias polacas, refugiadas do nazismo, esperando um visto para a américa onde todas as possibilidades as esperavam. Não havia língua intermediária entre elas e as recém-chegadas, mas naquela vila húmida de quase só uma rua, saíram, trocaram sapatos, e emprestaram os cobertores de papa que na altura pesavam sobre os ombros de todos, no frio de um inverno de senhas de racionamento (ninguém se lembra deste episódio, mas eu sei, que a minha mãe, a da esquerda, mo contou). Ouviam a bbc de londres, como diziam, em frente ao café edgard até adormecerem em pé. As notícias chegavam por um rádio com o som no máximo virado para a rua. Muito depois disto, a tia gena partiu para moçambique e enviava notícias demasiado lacónicas para as outras que desconheciam totalmente o que fosse viver em áfrica. A tia gena teve que voltar com o marido e a filha, de oito anos, depois do 25 de abril. Voltou pobre e desiludida, mas nunca a ouvimos dizer que no tempo do salazar é que era bom. Por muito que lhe dissessem o contrário, à volta, ela sabia que não era, porque tinha vivido esse tempo, o tempo da fotografia de que falo. Recomeçou, mas fechou-se cada vez mais a um mundo vertiginoso que se recusava a compreender. Reuniu-se às irmãs, viu morrer o pai a quem todas eram tão ligadas. A mãe rosa, de quem herdei o nome e a memória única que mais nenhum dos netos pôde ter, tinha morrido muito antes, de uma daquelas doenças fulminantes cujo nome não se ousava pronunciar, com o sangue contaminado por leucócitos exterminadores. O pai desapareceu depois de uma velhice conturbada e, no final, penosa de assistir para cada uma delas. Todas tiveram filhos, alguns, como eu, complicados e insatisfeitos. A primeira irmã fugiu enquanto dormia depois de nos ter assegurado na noite anterior que tudo estava bem. Era a minha mãe e deixou-nos, tão desfeitos há quinze anos como agora.




Daqui a algumas horas vamos todos ver pela última vez o que restou da tia eugénia.

(rosaarosa)

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Palmira F. Silva

Ontem, na dois, ao diálogo com um crente. Aqui.

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(Cartaz arrancado pelos serviços camarários, um dia depois dos valentões nacionalistas ameaçarem Ricardo Araújo Pereira e a família. Como diria Bento XVI, nada de positivo vem da Câmara de Lisboa.)

Educação sentimental


Maggie Taylor

Os que pensam que amor a tudo sobrevive, experimentem com roquefort (estragado). Experimentem na terra que não vou nomear, na sala do fundo do restaurante, entre famílias silenciosas e sopas de um peixe morto. Experimentem com romeo e julieta, mas em folhas enroladas das antilhas. Experimentem com uma calva eminente, um gosto exagerado pela sociobiologia, agora embrulhada em John Gray.

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04 abril 2007

Férias escolares




Nas férias escolares
as ruas aproveitam
a ausência das crianças
e de manhã os carros passam
preguiçosos
Nas escolas só o rumor
da revolta em turnos
dos professores
Nos correios
os pensionistas confraternizam
com os funcionários
e os da Anadia trazem
folares com ovos
Nas férias escolares
começam a fazer sentido
as melhores previsões
metereológicas
Os comendadores estão a dormir
Fazem-se limpezas
e projectos
As teses adiadas
(talvez o presidente do júri
entretanto morra)
Podemos finalmente
escrever para os amigos

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Nem válvula




Tendo tido notícia do aperto de uma das válvulas do meu coração, um amigo investigador pediu-me stem cells para a tentar reconstituir. Procurei laboriosamente e enviei-lhe as que pude encontrar. Ele lá pôs aquilo a germinar. O resultado foi péssimo. Só havia células unipotenciais, de órgãos desinteressantes, ligados aos humores mais baixos. Chamou-me ao laboratório. Era eu, visto pelos meus comentadores sazonais.

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Sábado de Aleluia, uns anos atrás


Ron Mueck, A girl, exposto em Málaga

Bom dia miúda. Vê lá se nasces outra vez.

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02 abril 2007

Rapazes, alguma reserva


(Maggie Taylor)

No início deste blog esforcei-me por dar alguns conselhos a uns rapazes. Eles não ouviram. Os rapazes lêem pouco, mais coisas técnicas ou de desporto. Os posts, modestos mas sinceros, foram ter a outros destinatários. Sem querer, dei informação excessiva a quem dela não necessitava. É sempre assim. Quase sempre. As mulheres da classe alta entopem as consultas chequeando maminhas e úteros e as necessitadas nem conhecem risco nem vacinas. Era costume, nas famílias, as raparigas receberem, das mães e das mulheres mais velhas, algumas instrução preparatória: sobre a linguagem, as maneiras, fingimentos. As meninas deviam disfarçar os sentimentos. A razão principal para isso acontecer é que nem todos os que nos rodeiam são escuteiros ou militantes da Ajuda de Berço. A segunda razão é que existe uma certa distância entre o que se diz e o que se quer dizer. A terceira é que nem sempre sabemos o que sentimos. Se as mulheres fossem transparentes os homens podiam ser todos autistas. Fingimos todos e as mulheres melhor, com mais elegância, mais sentido estético. Quando deixamos de o fazer somos patéticos. Internam-nos, medicam-nos, evitam-nos. Vem isto a propósito da educação sentimental. Ninguém deu aos rapazes os rudimentos da educação sentimental. Vejo-os muito desprotegidos. O que escrevi sobre Roberto aconteceu-lhe mesmo. E não foi a primeira vez que lhe aconteceu. Gosto mais de Violeta que de Roberto. Roberto nunca me lerá. Se alguma vez o fizesse queria dizer – lhe que as mulheres gostam de ser amadas com reserva.

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Roberto e Violeta


(Maggie Taylor)


Roberto não conseguiu logo olhar Violeta nos olhos. Nem em sítio nenhum do corpo dela. A raiz dos cabelos, a sombra da face, esse ponto perturbador que os Recém-nascidos olham, foi o mais que ele pôde.
Depois trocaram os telefones e à noite um sms equivoco. Ela andava entediada e foi respondendo. Ao fim de uma hora espantou-se com a velocidade com que a coisa andava. Tomaram café juntos, foram ao cinema. Ele gostou tanto dela que ora não dizia frases completas ora era excessivamente loquaz. Passou os sinais vermelhos, galgou passeios, raspou paredes, meteu mal a terceira. Cometeu, um a um, todos os erros. Falou-lhe da última namorada e do desgosto. Da mãe. Do emprego. Das suas novas responsabilidades. Um dia jantaram. À sobremesa Roberto sentiu-se na obrigação de beijar Violeta. Entusiasmou-se.
Era cedo, deviam conhecer-se melhor. (Violeta)
Era precisamente isso que ele queria, conhecê-la melhor. Na cama adorou-a. Violeta não precisava de tanto espalhafato. Pensava na senhora de baixo, de como a ia encarar nas escadas, a partir de agora. E na degola dos bezerros. Não queria ser amada assim, tanto. Despediu-o como as mulheres despedem os homens que não querem magoar, nem deles receber mais notícias nesta encarnação.

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01 abril 2007

Primeiro de Abril


J. Caruncho

Um de Abril de dois mil e sete, Odisseia na Terra. Governando com maioria absoluta o Partido dos Socialistas construia uma sociedade mais justa. Para assinalar a Páscoa, o mais cordeiro dos ministros, introduziu taxas moderadoras simbólicas nos internamentos e nas cirurgias. Duas esperanças despontavam no horizonte: Portas o fragateiro, e um quase desconhecido de nome Lopes. A esquerda festejou a descoberta científica que assegura serem os homens naturalmente bons, sobretudo os selvagens, sobretudo as mulheres.
O amor podia ser eterno.

Sócrates e Álvaro de Campos eram dois engenheiros etereosexuais.

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